O estabelecimento do culto de Nossa Senhora de Lourdes na vila das Lajes era da máxima oportunidade. Apesar dos perseverantes esforço de seus párocos, notava-se há muito, no espírito religioso da população, um marasmo desolador bem patenteado no definhamento das associações de piedade, na pobreza das igrejas, no abandono dumas e desabamento doutros.
Isto escreveu Dom João Paulino no “Peregrino de Lourdes” de 6 de Julho de 1889. Todavia, importa referir que, antes que se desse o acontecimento que Mons. António Maria Ferreira, narra no seu livro “Perfumes de Lourdes”(1892), já os lajenses tinham uma devoção especial pela Virgem aparecida em Lourdes à Vidente, hoje Santa Bernardete.
Em 1882, uma tremenda tempestade se levantou impedindo que os botes baleeiros que haviam partido de manhã para mais uma caçada à baleia, se vissem impedidos de entrar no porto. O povo reunido junto ao porto, vivia momentos de grande aflição. “Nos momentos de maior angústia aparece ali um filho da localidade que era considerado por todos como tendo sido objecto de uma insigne graça de Nossa Senhora de Lourdes (...) que de envolta com os gritos de angústias que continuo irrompiam de todos os peitos eram repetidamente ouvidas de diferentes pontos da multidão as exclamações:- Nossa Senhora de Lourdes livrai-os do perigo – Nossa Senhora de Lourdes salvai-os!”- “O facto é que a tempestade serenou, as embarcações entraram, a salvo no porto e da tripulação ninguém sofreu o menor dano.” (1)
E o Autor , ao iniciar a narração da devoção à Virgem de Lourdes nas Lajes do Pico, diz: “Foi também o primeiro lugar dos Açores onde Nossa Senhora de Lourdes começou a ser publicamente invocada...”(1)Conclui-se, facilmente, que a Devoção à Virgem aparecida em 11 de Fevereiro de 1858 – cerca de vinte e cinco anos haviam decorrido – estava já enraizada na alma dos lajenses, se bem que um quarto de século houvesse decorrido sobre o faustoso acontecimento, que foram as Aparições da Virgem na Gruta de Massabielle. Demais, é o próprio Mons. Ferreira que informa: “A esse tempo (1882) já alguns devotos tinham tido o feliz pensamento de removerem uma subscrição para a aquisição de uma imagem de Nª Senhora de Lourdes, destinada à matriz daquela vila.“(1) A subscrição realizou-se, imediatamente, após os acontecimentos do porto, em 1882. E é D. João Paulino que nos dá a lista dos subscritores: Pe. António Ribeiro Homem da Costa (vigário da Matriz), Pe. Manuel d´Ávila Leal Ferreira, P. João Pereira da Terra, P. Francisco Xavier de Azevedo e Castro (todos curas da Matriz), Pe. João Paulino de Azevedo e Castro (reitor do Seminário de Angra), Manuel Paulino da Silveira Bettencourt, D. Maria Angélica de Azevedo Bettencourt, António Homem da Costa, José de Faria, António Rodrigues, António da Rosa Vieira, Manuel Pereira de Macedo, Manuel Vieira Rodrigues, José de Brum Bettencourt, Francisco Vieira da Rosa, João Filipe, Tomás Garcia, Manuel Silveira Carvão, António Xavier da Silveira Bettencourt, Manuel Joaquim Machado, Manuel Cardoso Machado Bettencourt, D. Laureana de Azevedo Castro Neves, a empresa baleeira de que é director Amaro Adrião de Azevedo e Castro e Dr. João Soares de Lacerda.
A Imagem chegou às Lajes em 4 de Setembro de 1883 e a primeira festa teve lugar no final desse mês, para nos anos seguintes se realizar no último domingo de Agosto, e está enriquecida com indulgências plenária e parciais, concedidas no ano de 1884 pelo Papa Leão XIII.
A festa continua com o mesmo programa de 1883: Novenário solene, Missa de comunhão geral e Missa Solene e Procissão a percorrer as ruas principais da Vila com paragem na Pesqueira, onde os baleeiros postavam as respectivas canoas de velas alçadas e lhe prestavam, e prestam ainda, suas homenagens.
No sábado havia arraial nocturno, com concertos pelas filarmónicas, normalmente vinha uma do Faial, e iluminação chinesa e fogo preso. Actualmente, é um pouco diferente a parte externa que evoluiu com o rodar dos tempos. Mantêm-se as solenidades litúrgicas, com o mesmo esquema de 1883 ( há 130 anos), e nessas nada há a alterar. Os povos, de perto e de longe, que não apenas os paroquianos lajenses, respeitam e vivem, sentidamente, estes dez dias de culto sincero e místico, dedicados à Virgem de Lourdes, padroeira dos lajenses, dos baleeiros e de quantos à Senhora recorrem!
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1) Ferreira, António Maria, Perfumes de Lourdes, 1892.
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